quinta-feira, 18 de março de 2010

O SHOW



Foram 17 anos de espera. Honestamente, nunca pensei que os veria aqui em Porto Alegre. Já tinha me conformado com a idéia de que teria que ir ao Rio ou São Paulo para vê-los ao vivo. Mas eu iria. Isto já estava decidido. Há muito tempo. Mais ou menos 17 anos.
Mas, afinal, eles vieram. Aqui. Porto Alegre. Não havia a mínima possibilidade de eu não ir. Fora de cogitação! Nem que eu tivesse que vender a minha mãe. Ok. Eu não venderia a minha mãe, mas confesso que outras loucuras me passaram pela cabeça. Não importava como, eu TINHA que ir.
Quando os ingressos começaram a ser vendidos eu estava sem dinheiro. Nenhuma previsão imediata de entrada de capital. O pavor começou a me fazer cócegas. E se os ingressos esgotassem antes que eu conseguisse o dinheiro? E se sobrassem ingressos e eu continuasse sem dinheiro? Resolvi cometer o desatino de comprar pela internet. Tinha que pagar a taxa de conveniência? Azar! Tinha que pagar pela entrega? Azar! Se o meu ingresso estivesse garantido, eu pagaria. E paguei. Sem remorso. Paguei mesmo. Quase tive um colapso de ansiedade esperando o e-mail de confirmação da compra. Só voltei a respirar direito quando abri minha caixa de entrada e ele estava lá. Agora era esperar que o dia chegasse.
E o maldito dia não chegava. Eu saí de férias. Viajei. Fiquei uma semana fora. Voltei. Fiquei mais uma semana em casa, vegetando feito um quiabo. E o maldito dia não chegava. As férias terminaram. Voltei a trabalhar. Correndo para botar tudo em dia. E o maldito dia não chegava. Mudaram o local da apresentação. Os shows nos outros estados foram franca e alegremente avacalhados pela crítica (eu sei, e quem se importa com a crítica? Tudo bem, mas ainda assim eram opiniões sobre o que tinha, ou não, acontecido). O show no Rio não aconteceu. O que aconteceria aqui? Se é que aconteceria.
E o maldito dia chegou. Eu mal podia acreditar. Juro. Pode parecer ridículo e adolescente, mas naquele momento eu era ridícula e adolescente. Aliás, até aquele momento eu fui uma adolescente. Bem lá no fundo (ou não tão fundo assim), uma parte de mim ficou esperando aquele momento para se despedir da adolescência. Uma parte bem considerável, é bom que se diga. E foi justamente esta parte adolescente, para quem tudo é festa, para quem qualquer indiada vale a pena, que salvou a minha noite.
Quando cheguei na frente da Fiergs, depois de intermináveis e angustiantes 40 minutos dentro de um ônibus (que normalmente leva, no máximo, 10 minutos para fazer o mesmo trajeto), minhas pernas começaram a tremer. Até encontrar o final da fila foram mais 5 ou 6 minutos de caminhada. Sim, o final da fila estava perto da Freeway. Mas, azar! Era lá que eu queria estar.
Mais de uma hora até entrar no estacionamento onde seria o show. Minha mãe ligou e disse que tinha visto na internet que haveria um atraso de uma hora por causa da destruição lá no Rio. Tudo bem, pensei, uma hora não é nada. Azar! Vamos lá!
Uma hora? Bom, todo mundo já sabe que foram 3 horas de atraso. Eles subiram no palco pouco antes das duas da manhã. E eu estava de pé desde as sete. A fase da dor nos pés e nos joelhos já tinha passado há muito tempo. Como eu disse antes, foi a minha porção adolescente que me salvou. Porque eu sabia que esta era A oportunidade de vê-los aqui, e a minha porção adolescente só pensava "Azar! Não saio daqui sem ver tudo! Não saio! E daí que vai começar só as duas da manhã? Foda-se! Não quero nem saber!".
Mais adolescente impossível...
Quando terminou o interminável show do Sebastian (e daí que ele é amigo pessoal do Axl? Eu tenho pavor do cara!) e as luzes se apagaram, parecia que meu coração ia explodir de tanta ansiedade. Pensei que fosse desatar a chorar ali mesmo, na frente de todo mundo.
E então as luzes se acenderam. Confesso que não sou das maiores entusiastas do novo álbum. Na verdade, eu estava lá por causa do passado. Daquilo que já tinha sido e não voltaria mais, mas que eu precisava ver acontecer diante dos meus olhos. E vi. Mais que isso, eu ouvi.
Sim, Axl está um porco gordo. Não, Axl não tem mais "aquele" fôlego. Não, Axl não fica mais pelado na terceira música, só de bermudinha branca, agora ele troca de camisa na terceira música. Uma sem mangas por outra de mangas compridas. Constrangedor? Nem me fale... Não, Axl não fica correndo o tempo todo de um lado ao outro do palco. Ele corre, mas faz uma pausa no meio.
Sim, Axl ainda tem voz para cantar aquilo que todos nós fomos lá para ouvir. E todo mundo cantou. Com um fôlego de jovens de 17 anos. Quando começou o solo de Welcome to the Jungle, todo mundo, sem exceção, voltou à adolescência. Não era mais só eu. Homens já meio grisalhos, alguns carecas, mulheres com algumas rugas, outras com os cabelos brancos disfarçados com luzes, algumas barriguinhas salientes, mas os olhos brilhavam com a força da juventude que cresceu ouvindo aquela música alta. E a garganta ficou pequena para comportar a força daquelas vozes. A voz era muito baixa para gritar aqueles refrões.
E alguém se lembrava que eles tinham atrasado 3 horas? Ninguém lembrava de mais nada. Só o que importava era o gordinho cabeludo que corria de lá para cá no palco.
Sim, os outros fazem falta. Esta formação pode ser muito bem intencionada, pode ter muita força de vontade, mas não dá. Não é a mesma coisa. Não mesmo. Mas isso também não importava, porque eles estavam ali, nos dando o que queríamos. Mr. Brownstone. Live and Let Die. I Used to Love Her. It’s So Easy. You Could be Mine. Tudo estava lá. Tudo! E, entre uma e outra, a democracia chinesa nos dava tempo de recuperar o fôlego.
Sim, quem olhar de fora vai dizer que foi um absurdo tudo o que aconteceu. Sim, foi mesmo. Sim, muita gente foi embora antes, e com razão. Mas estas pessoas vão se arrepender um dia. Eu não. Não me arrependo de nada. Fiquei nove horas de pé. Tive dor nas pernas, nos pés, nas costas, no pescoço. No outro dia, um zumbi teria uma aparência melhor do que a minha. Mas eu não me arrependo. Faria tudo de novo. Porque eu ouvi November Rain e Sweet Chil O’Mine ao vivo.

E quando tocou Patience, eu chorei.